SALAS DE EXPOSIÇÃO

Foto: Instituto Paulo Freire

A insustentabilidade da ditadura militar, em face da grave crise econômica e política que se intensificou no Brasil, a partir do final dos anos 1970, tornou-se fator determinante para o início de um lento processo de abertura política. Findo o chamado “milagre econômico” (1968-1973), que se caracterizou pela internacionalização da economia brasileira, a intensificação do desenvolvimento industrial e o aumento do Produto Interno Bruto (PIB), a situação do país começou a se deteriorar e o povo passou a conviver com altas taxas de inflação. Concorreu para isso a crise do petróleo no mercado internacional, em 1973, e o consequente aumento do preço do combustível. 

Em 1974, a inflação era de quase 30% ao ano, alcançando uma taxa de 242,24% ao final da ditadura. Acrescente-se a isso a queda dos investimentos na economia e a decorrente redução do consumo e da geração de empregos no país, o que levou o governo militar a perder apoio. Ao lado disso, o endurecimento do regime ditatorial, com as graves violações aos direitos humanos, as repressões violentas e a restrição à liberdade, fez diversos setores da sociedade se mobilizarem e denunciarem as atrocidades cometidas pelos agentes do governo, tornando impraticável a manutenção da ditadura militar no Brasil.

Fotos: Instituto Paulo Freire

Em 28 de agosto de 1979, como decorrência de ampla mobilização social, foi sancionada a Lei da Anistia, que propiciou condições para que os exilados políticos retornassem ao país. Nesse contexto, após 16 anos de exílio, Paulo Freire visitou o Brasil, a fim de sondar as possibilidades de seu retorno definitivo, o que somente veio a ocorrer no ano seguinte, quando retornou acompanhado da família.

A presença do grande educador brasileiro em sua terra natal, a partir de 1980, enriqueceu o novo momento da educação nacional, com a retomada de projetos silenciados pela ditadura e a criação de políticas públicas educacionais que visavam à reconstrução da democracia no Brasil.

O acolhimento a Paulo Freire, em solo brasileiro, por profissionais da educação, intelectuais, políticos e representantes da ala progressista da Igreja Católica demonstra o reconhecimento de sua integridade como pessoa humana e proeminente educador, que passou a atuar como docente na Universidade de Campinas (Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e a residir com a família em São Paulo.

No decorrer dos primeiros anos de seu retorno ao Brasil, Paulo Freire teve de enfrentar alguns revezes provocados pelo autoritarismo ainda vigente, como a exigência de justificativa à Unicamp pelo seu aceite para fazer parte do quadro de docentes. Apesar da insatisfação generalizada e da resistência cada vez maior da população brasileira, a derrocada do regime militar somente se daria após a campanha das “Diretas Já” e a eleição de Tancredo Neves, embora de forma indireta, para a presidência do país, cargo que, devido ao inesperado falecimento de seu titular, foi assumido pelo vice-presidente eleito, José Sarney. Iniciou-se, a partir de 1985, o período conhecido como Nova República.

Ao proceder à análise da conjuntura e das alternativas que se apresentam no país, Paulo Freire decidiu ingressar na política. Já nos primeiros meses de residência em São Paulo, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores (PT), em 1980, e se responsabilizou pela elaboração do programa de educação do PT.

O documento partidário, conforme sinaliza o professor Carlos Brandão, foi elaborado com a participação dele, bem como dos professores Demerval Saviani e Moacir Gadotti, tendo sido publicado pelo Núcleo dos Professores do Partido dos Trabalhadores do Distrito Federal.

A vida do educador no Brasil foi marcada por múltiplos compromissos acadêmicos, viagens internacionais e intensa produção intelectual. À luz das experiências realizadas, Paulo Freire desenvolveu reflexões em torno dos seus achados e os divulgou em suas obras.

Em meio a inúmeras atividades, Paulo Freire enfrentou o falecimento repentino de sua esposa, Elza Maia Costa de Oliveira, no ano de 1986. A perda de sua companheira de longa jornada trouxe-lhe tristeza e causou-lhe depressão, deixando-o muito abatido em seu luto. Esse estado de espírito somente foi superado ao conhecer Ana Maria Araújo (Nita), por quem se apaixonou e veio a casar-se em 1988.

Com a eleição de Luiza Erundina à Prefeitura Municipal de São Paulo, o educador foi convidado a assumir como Secretário de Educação, cargo que exerceu no período de 1989 a 1991. Durante a sua gestão, implementou vários projetos importantes, com destaque à criação do Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA), um modelo de programa público de apoio a salas comunitárias de Educação de Jovens e Adultos (EJA), até hoje adotado como política pública em diversas localidades.

A repercussão do retorno de Paulo Freire ecoou em todo país, tendo recebido convites de muitos estados da Federação para proferir palestras, participar de congressos e eventos da área de educação, com vistas a compartilhar conhecimento e colaborar em projetos de interesse social. A imensa contribuição desse ilustre educador será concretizada também em Brasília, para onde se deslocou, com frequência, conforme será detalhado na sequência desta exposição. (Ver O reencontro com Brasília).

Foto: Instituto Paulo Freire